segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Entrevista com Mano Robson "Nascido Pra Guerra"


"Assim como "Emicida" uma das maiores referências atuais da nova safra do Hip Hop brasileiro, "Mano Robson" de forma independente se destaca pelas redes de internet, com o CD entitulado "Nascido Pra Guerra", tráz a conhecimento público como sobrevive um jovem negro em Codó, interior Maranhense."

por: Gildean Silva Panikinho - Pode Crê!


Já não é de hoje, que a cena do Hip Hop Paulista se surpreende com produções e personalidades expressivas, que vem de outros estados, principalmente das regiões norte e nordeste, São Paulo que é conhecido e divulgado mundo a fora, como o berço do Hip Hop brasileiro, nem sempre se lembra que, grande parte da população que compõe a grande massa periférica da maior e mais rica metrópole da América Latina, também é muito nordestina. O exemplo de guerreiros como Lamartine, Nando e o saudoso Preto Góes (Clã Nordestino), Zé Brown e Tigger (ex. Faces do Subúrbio), e até mesmo “im memorian” do inesquecível Chico Science (ex. Nação Zumbi), que desbravaram com todas as dificuldades rumo à São Paulo, sem busca de realizar seus sonhos de transmitir suas idéias, seus posicionamentos, angústias e principalmente apresentar propostas de mudanças através do canal mais expressivo e reconhecido do Hip Hop, que é a poesia rimada do Rap, não fez com que o sonho morresse , o mesmo sonho de todos os retirantes na busca de oportunidades, de um lugar ao sol de tod@s. Assim como hoje já ouvimos rumores de que as melhores expressões do Rap nacional, encontra-se na região nordestina, assim como Rapadura (Ceará), Expressão Feminina e Da Baixada(Pará), Dj Erivam e Costa a Costa (Fortaleza), Afronto e A Irmandade(Piauí), novos desbravadores de sonhos começam a surgir, assim como Mano Robson, que nasceu no itaim, zona leste de Sampa até os 11 anos, mudou-se para Codó, interior do Maranhão, onde devido às situações de discriminação racial sofrida na pele, fundou o grupo “Tiroteio Verbal”, para através da poesia rimada, denunciar suas e expressar suas indignações, assim com a música “Do outro lado da Ponte” se destacou na pequena cidade de Codó (MA), até ser convidado a se mudar para Teresina (PI), para fazer um curso de montagem e manutenção de Pcs, onde se destaca na cena do Hip Hop Piauiense, que é mais forte, devido ser o único estado nordestino a ter uma “Casa do Hip Hop” fora de São Paulo.

Ao passar por Sampa com o seu CD embaixo do braço, e com sua história guerreira, Panikinho fez uma entrevista para saber um pouco mais sobre éssa trajetória que promete ser um ótimo referencial para a o movimento Hip Hop Nacional;

Panikinho Pode Crê! - Como começou o projeto do Cd "Nascido Pra Guerra", fale das Letras e Produção?

Mano Robson - O CD começou a partir da inspiração na minha propria realidade, do que vejo, do que sinto, o O CD e as musicas são é uma dissertação auto biográfica do meu cotidiano, e consequentemente dos que estão à minha volta, que se parecem comigo, que sofrem da mesma dor. A produção foi feita por mim e pelo meu parceiro Petekão da Casa do Hip Hop no Piauí, um dos melhores produtores que temos lá.

Panikinho Pode Crê!- Quais são as dificuldades e as vantagens de se fazer Rap na região nordeste do país?

Mano Robson- As dificuldades são várias mano, que vão desde a falta de acesso à equipamentos, materiais para o aprimoramento do trabalho, até a falta de apoio por parte dos orgãos públicos ligado à incentivos culturais, que poderiam nos ajudar, mas pelo contrário sempre dificultam nossa caminhada,ja perdi até as contas de quantas vezes fomos convidados para representar o município em festivais e dentro e fora do Estado, e nunca conseguimos se quer o transporte, um obrigado, uma ajuda de custo, nem passagens para nos deslocar-mos de Codó pra São Luis, nada!

Panikinho Pode Crê!- Como é ser Negro em Codó? Fale sobre a questão racial nas letras de Rap ainda é necessário?

Mano Robson- Mano, ser negro numa sociedada racista ja é complicado, em Codó então, que ainda tem resquícios de tradições escravocratas, coronelismo, barões que cumprem papeis de novos senhores de engenho e uma polícia que cumpre papel de capitães do mato, eu sei de onde vim, sei da minha história e do meu povo, mais aqui em Codó a maioria não sabe. Eu e minha BAN-K, é quem somos aqueles que tentam atravéz do Rap, abrir os olhos do nosso povo, para não cairem nas armadilhas dos poderosos da cidade, que enriquessem à custas do trabalho escravo contemporaneo, entende!.

Panikinho Pode Crê!- Porque lançar o CD na Fundação Casa(ex Febém) da maior metrópole Brasileira?

Mano Robson - Então o CD "Nascido Guerra" ao mesmo tempo que narra como é morar no gueto, o lado esquecido pelas autoridades, onde os jovens não tem acesso à um minimo acesso aos servços públicos de qualidade, escola, hospital, emprego digno, também fala de auto estima, de não se render às dificuldades e perder a cabeça, mensagens positivas, e nada melhor do que éssa mensagem chegar à quem mais precisa primeiro, que são esses meninos que trocou a pipa pela tranca.

Panikinho Pode Crê!-- Soubemos que você tem muito conhecimento em tecnologia alternativa,
como Softwere livre, plataforma Linux, fale como o adiquiriu e da sua importância nos dias de hoje, com a questão da Educação e a Exclusão Digital?

Mano Robson- Hoje em dia ja não se fala mais tanto naquele analfabeto, que não sabe ler ou escrever, e sim , naqueles que não tem acesso à tecnologia, eu sou técnico especialista em software livre, desde 2006, devido ào aproveitamento que fiz de um projeto social chamado Centro de Referencia da Cultura Hip Hop, que numa parceiria com o Minc, levou cursos de Linux para a cidade de Teresina que é onde morei por 4 anos. para a Educação é super importante os alunos terem acesso e se apropriar dessas ferramentas tecnológicas, Saber criar, ler , enviar um e-mail é o básico para quem quer se comunicar e eliminar fronteiras, e foi justamente éssa ferramenta que possibilitou que eu estivésse aqui hoje em São Paulo para lançar e divulçgar meu CD


Panikinho Pode Crê!-Quais são seus planos, e como vê o futuro do hip hop nacional?


Mano Robson- Meus planos são continuar a caminhada, ajudar a quem precisa ser ajudado, assim como não fiz nada sózinho também. eu vejo o futuro do Hip Hop mais maduro, independente e consciênte de sua responsabilidade, ja vejo frutos disso como o Rapper Emicida que ja conhecia o trabalho dele como Freestyle, na na net, mas fiquei impressionado com a apresentação dele no III Encontro Paulista de Hip Hop, onde demonstrou maturidade, atitude, muito profissionalismo e respeito ao publico, sem contar outros de outras modalidades do movimento, éssa nova geração ta chegando aos poucos, e se destacando na cena nacional, O Amazon B.Boy por exemplo que mescla movimentos da dança com tradições da cultuta indígena, Varios Djs e Graffiteiros que também vem evoluindo o Hip Hop nacional para outro nivel. Mais uma coisa que tem que ser dita também, é que não devemos ser apenas bons artistas, mas sim, bons militantes, para o nosso proprio bem e para o bem do Hip Hop.

Panikinho Pode Crê! - Como foi sua passagem por São Paulo, a recepção, as pessoas, o clima
do movimento, entre outras coisas?

Mano Robson- Po cara! melhor seria impossivel, conheci vários mano e Minas que só tinha contato por fotos em revistas, internet , sites e-mails, fui muito bem recebido, vou levar uma boa impressão do que vi e vivenciei aqui, para o Maranhão e o Piauí, muitos esperam que os adéptos do Hip Hop sejam uma grande família no país,.nem sempre vemos éssa postura com todos, mas com certeza éssa articulação irá render frutos, para todos, como ja rendeu pra mim, e agora que éssa conexão esta feita, em breve muitos daqui de Sampa estarão lá também.

Panikinho Pode Crê! - Deixe uma mensagem para as novas gerações da musica negra contemporânea?

Mano Robson- então eu vou fazer o seguinte escrever uma mensagem em forma de ritimo e poesia, beleza!

"ACREDITE EM VOCÊ, NÃO DESISTA DA BATALHA

VIRE, EXEMPLO, PRUS MANO DA QUEBRADA

QUE TÃO SEMPRE ALI, MEIO SEM ENTENDER

JOGADOS NO MUNDÃO, COORDENADOS A SOFRER"

trecho de "No Vale de Ossos Part II" (Mano Robson)


Panikinho Pode Crê!

Bom, aí está a entrevista com mais um dos milhares de guerreiros da paz universal, Mano Robson estará por São Paulo até a primeira semana de dezembro, atravéz do Projeto Arte na Casa da Ação Educativa, estará fazendo o lançamento do CD "Nascido Pra Guerra" na Fundação Casa, no dia 4/12, juntamente com a participação de Eli Efi (Ex DMN) que está em São Paulo para promover o a divulgação do Filme documentário "Estilo Hiop Hop" onde ele é um dos protagonistas principais e o Mc Canadense "Lou Piensa" do Grupo Nomadic Massive. Deixo aí o seu contato para quem quizer estabelecer um link direto. Paz!

Ouça o Cd " Nascido Pra Guerra"
http://palcomp3.com/manorobson/
--
Robson Luis Moreira
MSN: http://mail.google.com/mail/h/1058oejscpja7/?v=b&cs=wh&to=robcodo@hotmail.com
Celular: (99) 8809-5520
8858-3922 / 11 7459-6102


domingo, 13 de setembro de 2009

Nossos Motivos Pra Lutar Ainda São os Mesmos


Este texto é uma reflexão que foi redigida após debate sobre Violência Racial, promovido pelo Geledés instituto da Mulher Negra, com a participação de Mano Brown, Netinho de Paula, Hamilton Borges, e Luis Inácio na Câmara Municipal de São Paulo.

por Gildean Silva Panikinho


Para expressar minhas opiniões sobre a questão da "Violência Racial" vou partir de um lugar que é, estar na condição de um Jovem Negro bacharel e pós doutorado em “Sobrevivência” na Universidade da “Vida” na periferia suburbana da cidade de São Paulo, morador da Cidade Tiradentes(extremo, leste), considerado o maior conjunto habitacional da América Latina, primogênito de cinco irmãos dentre os quais duas mulheres, filho de retirantes nordestinos e bisneto de escravizados africanos com indígenas, pai de três filhos com a mesma companheira, sendo uma criança e dois pré-adolescentes. Sendo assim, não seria difícil assumir tranquilamente a responsabilidade a mim atribuída.

A mais de 100 anos, no momento pós-abolição, o projeto político do setor hegemônico da sociedade destina-se a exterminar a população negra. Para entender este horrível contexto não é necessário muita leitura, basta observar os projetos implementados, bem arquitetados para a promoção de várias formas de genocídio, à começar pelo genocídio de condição, passando pelo ideológico e político, o genocídio da mobilidade, genocídio de nossas capacidades expressivas e culturais, genocídio de nossas subjetividades, físico e mental, entre muitas outras.

Uma vez que nossos ancestrais não vieram a convite do império português, muito menos vieram na janelinha e nem trazendo bagagens, pelo contrário, foram arrancados violentamente de suas terras, tratados como coisas ou animais, e ainda assim resistiram a escravização desumana, e para nós, nada está perdido. Na ocasião da luta dos nossos ancestrais muito sangue foi derramado, e, ao contrário do que muitos pensam, houve muita resistência, batalhas e conquistas por inúmer@s heróis e heroínas, guerreir@s que se tornaram nossas referências negras e lideranças natas, líderes de muito crédito popular, sendo alguns; Ganga Zumba, Zumbi, Luiza Mahin, João Candido, Luis Gama, Preto Goes, Sabotage, entre vários que se foram nas trincheiras. Hoje, temos centenas de lideranças atuando na militância, e eu não tenho dúvidas que o ativismo do Movimento Negro e do Hip-Hop são determinantes neste processo de luta e resistência.

Desta forma, eu não posso jamais admitir a idéia de que algum outro movimento que não tenha o caráter político e ideológico como esses dois, pudesse desconsiderar todo o sangue derramado em 500 anos para chegar-mos aonde chegamos que, indubitavelmente, ainda esta longe do ideal. Entretanto, muito se sabe que as nossas crianças, meninos e meninas, assim como os meus filhos e vários jovens negros e negras das quebradas, favelas e vielas, morros e asfaltos, incomodarão muito mais, ocupando as nossas cotas nas cadeiras universitárias do que sendo humilhados diariamente em fundações de reabilitação, como a Fundação Casa (ex-febem), em filas indianas de cabeças baixas, mãos para trás, submetidos à disciplinas desmoralizantes e comendo o pão que a DENADAI amassou a troco de que??? sextas - básicas ou um “PISANTE-NIKE”, “PEITA DA Écko” e “LUPA BAUCHILON???", "A gente não quer só comida," o nosso povo também tem fome de dignidade , o assistencialismo seja ele qual for, também contribui para o nosso genocídio homeopático.

Enquanto isso o Hip Hop cresce e intervenciona, sem promessas de salvação, e quando não é assediado incomoda!, vocês sabem porque? Eu sei! E por incrivel que pareça os que sempre foram nossos algozes também sabem a resposta! É porque ele "não agrada o injusto e não amarela" na missão, eles sabem que o Hip-Hop ameaça o status quo e os seus dias de glória e fartura. E faz tudo isso sem precisar do uso de recursos bélicos, através das ondas sonoras, ativismo, informa-ação e comunicação, codificados de uma forma que somente entende quem naturalmente vivencia e se apropria desses códigos. Estes promovem identificações mútuas e coletivas através do valor estético que contrapõe o modelo padrão eurocêntrico, ocidentalizado e unilateral. E tudo isso representa o PODER.

O Hip Hop é uma alternaiva concreta de significação simbólica, na defesa dos direitos,na condução à autonomia crítica, na construção de conhecimento,no reconhecimento e assimilação de identidades de jovens negras e negros periféricos na reivenção da África, nesse contexto da diáspora negra.

O Hip Hop é uma cultura afrodiaspórica contemporânea que possue o maior número de adéptos no mundo, segundo a revista norte americana "Yés". Este movimento evolui e se adapta à toda e qualquer realidade geográfica existente no planeta, sendo um importante instrumento para reivindicação de direitos em inúmeros movimentos de resistência, frente a todo e qualquer poder hegemonico. Sua capacidade de hibridês é uma habilidade importante, que faz com que o Hip-Hop trabalhe a informação sem ser uma CNN, promova a educação sem ser uma teoria educativo-metodológica, politiza sem ser um partido político, liberta sem precisar de chaves. O Hip-Hop faz dançar, desenhar, pintar, criar, recriar, e auxilia na elaboração de estratégias de intervenção da realidade naturalizada.O Hip Hop é uma alternaiva concreta de significação simbólica, na defesa dos direitos,na condução à autonomia crítica, na construção de conhecimento,noreconhecimento e assimilação de identidade de jovens negras e negros periféricos na reivenção da África, nesse contexto da diáspora negra.

O Hip-Hop festeja discotecando para os amantes da boa música, transforma vinil em peças raras circulantes nos museus de cada quebrada, resignifica valores, tradições, estabelece tréguas entre etnias, religiões e culturas, interfere na relação do estado com a sociedade civil, contrariando as estatisticas e se posicionando na contramão de toda forma de manipulação da alma, do corpo, e da mente. O Hip-Hop apresentou a mim, quem realmente sou, o que posso e onde devo chegar. Me fez refletir sobre identidade, filosofia, diversidade, linguagem, subjetividade, coletividade, tecnologia e revolução. após toda essa defesa ao Hip-Hop, eu acredito, de fato, que as nossas melhores armas ainda são o microfone, a caneta e papel, os sons das pik ups, a dança e as pinturas muralísticas através dos sprays e uma mente muito bem articulada. Pois “os “Nossos Motivos Pra lutar Ainda São Os Mesmos”(racionais mcs), e é por isso que no dia em que eu suspeitar de que realmente a força possa ser a única saída, eu aposento o microfone.


PANIKINHO é mc do grupo Fator Ético da Cidade Tiradentes ZL-SP,é ativista e pesquisador da cultura Hip Hop, Educador Popular, Coordenador Regional do Projeto Arte na Casa (Ação Educativa), integrante da Soweto Organização Negra e Idealizador do projeto Hip Hop de Câmara.